O ex-comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes confirmou, em novo depoimento à Polícia Federal, ter participado de reuniões no Palácio do Planalto em que foram discutidas minutas de decretos para um suposto golpe de Estado. As afirmações foram feitas em depoimentos na operação Tempus Veritatis, que investiga tentativa de golpe após as eleições de 2022. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, levantou o sigilo sobre os testemunhos na última sexta-feira (15/3).
Em seu depoimento, Freire Gomes afirma que Bolsonaro apresentou ao comando das Forças Armadas, em dezembro de 2022, uma minuta de um decreto para reverter o resultado das eleições. Depois, outra reunião foi realizada com o presidente, em que uma versão mais enxuta do documento foi apresentada. O então Presidente da República Jair Bolsonaro teria apresentado nas reuniões hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO, Estado de Defesa e Estado de Sítio. As medidas constantes na minuta de decreto impediriam a posse do governo eleito. Freire Gomes ainda teria alertado Bolsonaro sobre uma possível responsabilização criminal pela intentona e ameaçou prendê-lo caso tentasse consumar o golpe de Estado.
Para Fabio Tavares, professor de Direito Constitucional e Pós-graduado em Direito Público, os depoimentos revelados pelo STF não colocam o ex-presidente no centro de nenhuma trama golpista. A minuta apresentada às forças armadas não teria sido uma arma para um golpe, porque o presidente da República tem o direito constitucional de convocar seus apoiadores e comandantes para discutir se é cabível a decretação do chamado Estado de Defesa.
O Estado de Defesa é um mecanismo outorgado pela Constituição Federal ao presidente da República, que pode decretá-lo se entender que há uma instabilidade social ou grave e iminente perigo contra a ordem pública, explica o especialista. “A Constituição não traz o conceito do que seria essa instabilidade, porque o constituinte originário deixou sob o crivo do presidente da República decidir quando seria caso de uma intervenção como essa”, afirma.
Então, não seria possível tratar essa minuta como uma minuta de golpe, uma vez que há previsão expressa da prerrogativa do presidente para propor o Estado de Defesa. Inclusive, a Carta Magna prevê que o presidente deve ouvir o Conselho de Defesa Nacional e o Conselho da República, e ao decretar o Estado de Defesa deve comunicar o Congresso Nacional, porque, dessa forma, será realizado o controle político. Se o Congresso decidir que houve equívoco e não é caso de Estado de Defesa, aí sim, o presidente pode responder por crime de responsabilidade, uma infração político administrativa.
“É por isso que quando provocado, Jair Bolsonaro afirma não ter ciência de nenhuma minuta de golpe, porque o que sugeriu na época era um possível Estado de Defesa. Seria um precedente muito perigoso permitir que um presidente fosse preso sem nenhum respaldo na lei ou na Constituição.”
Por fim, Fábio pontua que Jair Bolsonaro era o chefe supremo do comandante Freire Gomes, então atenta contra a lógica que ele se posicionaria dessa forma na presença do Presidente da República. Assim, essa narrativa se afasta da disciplina e hierarquia esperada dos membros das forças armadas.
Fonte:
Fabio Tavares Sobreira - professor de Direito Constitucional e Pós-graduado em Direito Público. Mestrando em Gestão e Políticas Públicas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).