A exploração de petróleo no litoral catarinense, prevista no 17º Leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), abrange as bacias de Santos e de Pelotas e se sobrepõe à área de reprodução de peixes capturados pelos pescadores do Estado.
O alerta foi vocalizado por especialistas durante audiência pública da Comissão de Economia, Ciência, Tecnologia, Minas e Energia, realizada na tarde de quinta-feira (5), na Assembleia Legislativa, para debater os impactos da exploração de petróleo no litoral.
“Há uma sobreposição de áreas de exploração e de reprodução do pescado industrial e artesanal, com perdas produtivas ou de incapacidade de disponibilidade de pescados para o consumo humano. Há falhas graves e não podemos deixar isso passar”, advertiu Juliano Bueno de Araújo, diretor do Observatório de Petróleo e Gás.
“O poder discricionário do estado foi levado a sua última consequência, no sentido de que a cúpula do Ministério Meio Ambiente ignorou o corpo técnico do Ibama e do ICMBio com relação aos perigos subjacentes. Têm áreas de elevado risco e além do direito ao meio ambiente equilibrado, tem o direito dos animais que estão correndo sério risco de extinção, pois se reproduzem na área que será explorada”, concordou Edmo Cidade de Jesus, advogado que ajuizou ação contra o leilão.
“O mar é vivo, se movimenta, o vazamento é aqui, mas com o vento sul, vai parar em São Paulo. Vento nordeste? Vai parar no Uruguai”, ponderou Paulo Horta, professor da UFSC, que lembrou que os impactos dos vazamentos serão sentidos nos manguezais, praias, na maricultura, pesca, no turismo e na reprodução dos peixes. “Vamos perder os berçários, ambientes onde a vida acontece”.
“Várias espécies serão atingidas, como tainha, sardinha, anchova, papa-terra, lula, camarão sete barbas e o camarão rosa, do sistema lagunar”, relacionou Ivo da Silva, presidente da Federação dos Pescadores do Estado de Santa Catarina (Fepesc).
A deputada Paulinha (sem partido), que sugeriu, juntamente com o deputado Padre Pedro Baldissera (PT), a realização da audiência pública, avaliou que é temerário leiloar as áreas sem estudos de impactos socioambientais.
“Mesmo que não haja vazamento, a contaminação será inevitável, não sabemos o tamanho dos prejuízos, mas sabemos que serão irreversíveis, afetando principalmente a pesca e o turismo”, declarou a parlamentar, que criticou a ANP por não ter realizado audiência pública no território catarinense para ouvir os interessados.
“Nenhuma audiência foi realizada com a população ou autoridade pública do estado ou dos municípios, fomos informados pelo Instituto Arayara e a audiência foi feita no Rio de Janeiro”, lamentou Paulinha.
A deputada descreveu a reação das pessoas ao comentar sobre os danos advindos da exploração.
“É como se não conseguissem absorver o nível de estrago, ‘isso não vai acontecer com a gente’. Não lhes parece crível que estamos na iminência de ter o litoral devastado dessa forma”, revelou Paulinha.
Impacto na renda e no emprego
Luiz Carlos Matsuda, que representou o Sindicato dos Armadores e das Indústrias da Pesca de Itajaí e Região (Sindipi) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Pesca de Santa Catarina (Sintrapesca), enfatizou os riscos econômicos da exploração de petróleo.
“Vai ter impacto na renda dos pescadores, não só os postos de trabalho serão ameaçados, na pesca industrial tem cota, o trabalhador depende daquilo que é capturado”, informou Matsuda.
Debate jurídico
Nicole Figueiredo de Oliveira, do Instituto Internacional Arayara, contou que ação civil pública foi ajuizada na Justiça Federal de Florianópolis, que acolheu os argumentos contra a exploração do petróleo, retirando do leilão 42 dos 50 blocos ofertados.
Entretanto, no dia 21 de julho, o TRF-4, sediado em Porto Alegre, acolheu petição da Advocacia-Geral da União (AGU), e manteve os 50 blocos no leilão, marcado para 7 de outubro.
Encaminhamentos
Paulinha, ao final da audiência, anunciou os encaminhamentos, que foram aprovados: protocolo de notícia de fato no Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e no Ministério Público Federal (MPF), para que acompanhem a ação judicial que pede o cancelamento do leilão até que as etapas legais sejam cumpridas.
A divulgação da Carta de Florianópolis, que menciona os cidadãos que participaram presencial e virtualmente da audiência e encabeça um abaixo-assinado contra a exploração.
Rodada de palestras com estudantes do ensino médio e de universidades, além de apelo às instituições privadas e públicas para que acompanhem a ação na condição de amicus curiae.